sexta-feira, 30 de novembro de 2018

O colapso da União Soviética reconsiderado


Trabalho apresentado ao Segundo Congresso Internacional, "Marx em Maio"

Roger Keeran e Thomas Kenny


Símbolo clássico da URSS
Em 2004, Thomas Kenny e eu escrevemos o livro O Socialismo Traído: Por trás do colapso da União Soviética. Desde esse ano, o livro foi publicado e resenhado na Bulgária, Rússia, Irã, Turquia, Grécia, Portugal, França, Cuba e Espanha. Juntos ou separadamente, os autores participaram em debates sobre o livro na Grécia, Portugal, França e Cuba, e foram publicadas várias críticas em jornais de esquerda. Nesta exposição, Kenny e eu queremos responder a dois tipos de críticas e a uma questão suscitadas pelo livro. Nele desenvolvemos uma explicação do colapso da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Usamos as palavras "colapso" e "traído" no título, apesar das possíveis conotações equívocas de ambas as palavras.

No entanto não se levantaram dúvidas sobre o que tentamos explicar, ou seja, a transformação radical que arredou do poder político o Partido Comunista da União Soviética (PCUS), aboliu a maioria da propriedade estatal, o planejamento centralizado e o sistema de serviços sociais, e fragmentou o Estado multinacional. Argumentamos que a União Soviética não colapsou porque o socialismo fracassou. Ao invés, o sistema socialista baseado na propriedade coletiva ou estatal e no planejamento central teve um assinalável êxito, em particular do ponto de vista do povo trabalhador. O sistema provou ser capaz de assegurar um crescimento econômico sustentado durante seis décadas, produziu notáveis inovações técnicas e científicas e proporcionou benefícios econômicos e sociais sem precedentes a todos os cidadãos. Ao mesmo tempo defendeu-se permanentemente da invasão externa, da sabotagem e ameaças, e prestou ajuda econômica, auxílio técnico e proteção militar a outras nações em luta pela independência e o socialismo.

A União Soviética, no entanto, teve problemas - alguns relacionados com a ossificação política e ideológica, outros ligados à quantidade e qualidade da produção da economia, outros ainda derivados da confrontação com o imperialismo. No entanto, não foram estes problemas que causaram o colapso do sistema. O que derrubou o socialismo soviético foram as políticas prosseguidas por Mikhail Gorbatchov. Essas políticas baseadas na crença de que os problemas do socialismo poderiam ser resolvidos através de concessões unilaterais ao imperialismo e da incorporação no socialismo de certas ideias e políticas do capitalismo. Estas ideias tinham raízes no discurso político soviético, mas nunca haviam triunfado de forma tão completa como com Gorbatchov.

O que permitiu que essas ideias ganhassem ascendência foi o fato de nas três décadas anteriores se ter desenvolvido dentro da União Soviética um setor pequeno-burguês, que se enraizou sobretudo na economia privada ilegal. Esta chamada "segunda economia", causou danos à primeira economia, desmoralizou uma parte da população, corrompeu segmentos do partido comunista e do governo, e forneceu uma base social para as políticas prosseguidas por Gorbatchov. Em vez de sarar os problemas do socialismo, as políticas de Gorbatchov provocaram num curto prazo o caos completo na economia e acabaram por derrubar o socialismo.


 Crítica número 1.


             Algumas críticas alegam que a nossa explicação ignora a causa profunda do colapso, isto é, que a tentativa de construir o socialismo na União Soviética estava condenada desde o início, devido ao insuficiente desenvolvimento das forças produtivas.

             Não é uma tese nova. Em 1918, Karl Kautski afirmou que a Rússia não estava preparada para o socialismo. A ideia provém de Karl Marx e Friedrich Engels, que acreditavam que só o desenvolvimento completo das forças produtivas no capitalismo criaria as pré-condições para a abolição das classes, e baseia-se numa descrição do atraso da Rússia feita por Engels em 1875. De acordo com este ponto de vista, a União Soviética só poderia avançar para o socialismo permitindo primeiro o florescimento da iniciativa privada e o desenvolvimento das forças produtivas através de empresas mistas com capitais estrangeiros. Ambas as coisas teriam acontecido se a União Soviética tivesse continuado a chamada Nova Política Econômica (NEP), introduzida por Lênin em 1921. O corolário desta tese é a alegação de que a União Soviética só poderia ter evitado o colapso se enveredasse pelo caminho atual da China ou do Vietnam, o caminho da "economia de mercado com orientação socialista".

Esta explicação levanta problemas maiores. Não é nada claro que o pensamento de Marx e Engels fosse, neste caso, a linha adequada a seguir pelos comunistas soviéticos nos anos 20. Mesmo que as condições soviéticas pudessem não ser as ideais para construir o socialismo, Marx tinha bem a consciência de que, como disse em 1853, "os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade; não a fazem sob circunstâncias da sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado".

Além disso, em 1917, a Rússia não era um país tão atrasado como o descreveu Engels em 1875. Possuía algumas das maiores fábricas do mundo, e dez por cento da sua população trabalhava na indústria. Reconhecidamente, a nova União Soviética continuava a ser essencialmente um país rural. Os líderes soviéticos, como Viatcheslav Mólotov, reconheceram mais tarde que o atraso "afetou negativamente o socialismo". Não obstante, aqueles que pensam que o atraso não só afetou negativamente o socialismo como o condenou, defrontam-se com três objeções. A primeira é a de que, por muito atrasada que estivesse no início dos anos 20, a União Soviética não se manteve nessa situação. Tendo como vantagens recursos naturais ricos, uma liderança talentosa e uma população motivada, a União Soviética tornou-se na segunda potência econômica, apenas superada pelos EUA. Em 1984, o economista Harry Shaffer escreveu: "Os Estados Unidos continuam à frente da União Soviética em termos de produção bruta e per capita, de consumo e nível de vida. Mas a União Soviética tem vindo a aproximar-se gradualmente dos Estados
Unidos."

Assim, mesmo que no início as forças produtivas estivessem num estado de atraso, tal não era certamente a situação em 1985. Apesar de o desenvolvimento industrial da União Soviética ser indiscutível, alguns acreditam, todavia, que o atraso original enfraqueceu fatalmente o sistema. Erwin Marquit afirma que o atraso original levou os soviéticos a recorrerem ao "modelo utópico da economia planejada", e que essa economia planejada "provou ser incapaz de acertar o passo com desenvolvimento tecnológico orientado pelo mercado no Ocidente". Isto não é convincente. Com efeito é precisamente o oposto que é verdadeiro. Foi através da propriedade estatal e do planejamento que a economia soviética fez progressos notáveis, não só economicamente mas também tecnologicamente. Nos anos 80, o desenvolvimento tecnológico soviético não igualava o dos EUA, mas não estava longe, e aproximava-se gradualmente. Num livro sobre ciência e tecnologia socialista, publicado em 1989, John W. Kiser III afirmou que a ideia do "fosso tecnológico" era um exagero criado pela "crença norte-americana na inferioridade inerente ao sistema soviético". Devido ao fato de a União Soviética não incentivar a comercialização das suas realizações tecnológicas, o Ocidente manteve "uma tendência persistente para as subestimar". Kiser assinala, entre outros, os avanços tecnológicos nos setores da metalurgia, química, indústria alimentar, biomedicina, alcançados pelos soviéticos e países socialistas do Leste europeu.

Quanto à tecnologia informática, em 1986, a CIA concluiu que existia um fosso entre a União Soviética e o Ocidente em matéria de software e hardware, mas ressalvava que "os soviéticos continuarão a fazer rápidos progressos em termos absolutos", e em dez ou 15 anos "as instituições científicas de topo terão provavelmente equipamentos comparáveis aos melhores que hoje dispõem os laboratórios nacionais dos EUA". Por outras palavras, o fosso tecnológico era pequeno e diminuía. Assim, o atraso tecnológico dificilmente pode explicar de forma convincente o colapso. Um segundo problema da explicação baseada no atraso tecnológico é a presunção de que a Nova Política Econômica (NEP), isto é, a promoção do desenvolvimento através da iniciativa privada e do investimento externo, seria uma opção real. É como afirmar que a Guerra Civil norte-americana poderia ter sido evitada se o Norte permitisse que a escravatura desaparecesse de modo natural. Apesar de esta ideia poder ser apelativa para aqueles que culpam os abolicionistas pela carnificina da Guerra Civil, poucos historiadores (caso haja algum) pensarão que tal era uma opção real em 1860. De igual modo, continuar com a NEP não era uma opção real para os soviéticos nos anos 20. Em 1921, os soviéticos viraram-se para a NEP para resolver problemas criados pelas políticas do «comunismo de guerra», em particular o desinteresse dos camponeses, provocado pelo confisco dos cereais. No entanto, em pouco tempo, a NEP gerou os seus próprios problemas.

Explicando porque é que os soviéticos abandonaram a NEP, o historiador E.H. Carr apontou três graves problemas. O primeiro é a ocorrência da chamada "crise das tesouras" em 1922-23, na qual a forte queda dos preços do trigo provocou penúria de alimentos, desemprego e sofrimento para os camponeses pobres e médios. O segundo foi a constatação por parte da maioria dos líderes soviéticos de que a NEP condenava a União Soviética a um longo período de atraso industrial, perspectiva aterradora e intolerável face à ameaça crescente de inimigos externos. O terceiro foi o açambarcamento da produção pelos camponeses, devido à queda dos preços agrícolas, provocando fome nas cidades. Por estas razões, a dependência do mercado e da iniciativa privada tornou-se insustentável.

Assim, foram problemas econômicos reais, bem como opções ideológicas, que levaram os líderes soviéticos a adotar novas políticas e aderir à propriedade estatal e à planificação centralizada. Nestas circunstâncias, chamar "utópica" à passagem para a propriedade estatal e planificação central é absurdo. Esta transição permitiu que a União Soviética se industrializasse num curto espaço de tempo, derrotasse a invasão nazista e reconstruísse rapidamente o país depois da guerra.

Além disso conseguiu ao mesmo tempo aumentar progressivamente o nível de vida dos trabalhadores soviéticos. Imaginar que a URSS poderia alcançar tais resultados, prosseguindo as problemáticas políticas da NEP, é simplesmente tomar os desejos por realidade. A explicação do colapso da URSS pelo atraso comporta um terceiro ponto fraco, que se revela quando examinamos as lições que se podem tirar desta explicação. É inteiramente apropriado avaliar a explicação através das lições que dela decorrem. Por exemplo, se um pastor morre ao cair de um penhasco na montanha, só um louco concluiria que se deve evitar o pastoreio e as montanhas. No entanto, se no momento do acidente, o pastor estivesse bêbado, uma pessoa razoável diria que se deve evitar beber quando se guardam ovelhas em encostas montanhosas. Alguns dos que subscrevem a tese do colapso da URSS devido ao atraso, concluem que a URSS deveria ter evitado a planificação central e seguido o caminho da China atual. Mas esta conclusão é tão sensata como evitar o pastoreio e as encostas montanhosas. No mínimo é irrefletida. Nem mesmo os próprios chineses tiram esta conclusão do colapso da União Soviética. Segundo afirma Arthur Waldron, "hoje, oficialmente, a China considera que nada de profundo ou fundamental estava errado na União Soviética, mesmo na segunda metade dos anos 80. De acordo com o discurso oficial, a falência da União Soviética continua a não ser atribuível a um amplo fenômeno sistêmico mas, pelo contrário, à falência muito específica do Partido Comunista da União Soviética."

Além disso, saber para onde conduziria em última instância a via chinesa e o que tal significaria para a classe operária, são questões que permanecem em aberto. A curto prazo, a via chinesa produziu crescimento econômico e aumentou os rendimentos da população urbana. No entanto, desde 2008, o declínio das taxas de crescimento econômico e as dificuldades causadas à economia chinesa pela estagnação do mercado mundial levantam dúvidas sobre a viabilidade futura deste modelo. Segundo o The New York Times, em março deste ano, o crescimento da China "desacelerou para o nível mais baixo em mais de uma década".

Em simultâneo, a classe operária chinesa está a pagar um preço elevado por uma via que se afasta progressivamente dos objetivos do socialismo. Durante a última década o desemprego não oficial nas cidades esteve sempre acima dos oito por cento. A parte do capital e investimento estrangeiros no total das vendas da China passou de 2,3 por cento em 1990 para 31,3 por cento em 2000. Como o investimento direto na China (124 bilhões de dólares em 2011) tem vindo a crescer anualmente, e apenas é superado pelo investimento estrangeiro nos Estados Unidos, a percentagem do capital estrangeiro é hoje inquestionavelmente maior do que em 2000. De resto, como constata um estudo recente, entre "os resultados inevitáveis do desenvolvimento capitalista da China", assinala-se o "aumento do desemprego, da desigualdade e da insegurança; cortes nos cuidados de saúde e educação pública; agravamento da opressão das mulheres; marginalização da agricultura; multiplicação das crises ambientais". Na medida em que a economia de mercado com orientação socialista é questionável enquanto via para o socialismo, também é questionável a conclusão que se retirou do colapso da URSS.

Em suma, a tese do atraso deve ser rejeitada por três razões. Primeiro, porque as forças produtivas da União Soviética não estavam subdesenvolvidas em 1985, por maior que fosse o seu atraso em 1917. Segundo, porque esta tese implica que a União Soviética deveria e poderia ter continuado a NEP. Esta ideia era insustentável à época e completamente fantasiosa em retrospectiva. Terceiro, se o caminho chinês ao socialismo é mais confiável do que o soviético ainda está por ser visto.

Crítica nº 2


            Um segundo tipo de críticas ao nosso livro surge a propósito da abordagem a Josef Stálin. Para alguns críticos, o fato de não se ter denunciado Stálin como um paranoico, um criminoso, um anti-semita, um demônio, um ditador e um assassino de massas, constitui uma falha fatal. Alguns críticos só ficaram satisfeitos se subscrevêssemos o que Domenico Losurdo chama de "uma lenda negra". Para eles, o fato de não termos condenado a crueldade de Stálin constitui uma omissão imperdoável. A estes gostaríamos de responder como Lenin respondeu a Maxim Gorky, quando este manifestou preocupação sobre "a crueldade das táticas revolucionárias". Lenin respondeu: "Que quer você? (...) Será possível agir humanamente num combate com tal ferocidade sem precedentes? Haverá aqui lugar à brandura e à generosidade? Estamos sob bloqueio da Europa, privados da esperada ajuda do proletariado europeu, vemos por todos os lados a contra-revolução rastejar contra nós como um urso. Que devemos fazer? Não devemos, não temos o direito de lutar e resistir? Desculpe, mas não somos tolos. (...) Com que critério avalia a quantidade de golpes necessários e excessivos no combate?"

A verdade é que não fazemos uma avaliação global de Stálin, porque consideramos que era um assunto demasiado importante para ser tratado de forma superficial num estudo dedicado a um tema diferente. Como qualquer historiador, levantamos uma questão específica – neste caso, as causas do colapso da União Soviética – e limitamo-nos a tentar responder a esta questão. Tratamos as ideias de Stálin e as suas políticas apenas na medida em que se relacionavam com a nossa exposição.

Mas porquanto a crítica à nossa abordagem de Stálin está ligada à nossa explicação do colapso, merece uma resposta. Aqui temos de fazer uma distinção. Como é sabido, existe uma corrente de pensamento, que remonta aos anos 20 e se estende até ao presente, segundo a qual a União Soviética entrou em declínio inexorável desde que rejeitou as ideias de Leon Trótski, sobre a necessidade de prosseguir a revolução permanente ao nível mundial e a inutilidade de construir o socialismo num só país. Deste ponto de vista, a União Soviética não construiu o socialismo, e o seu colapso representou apenas uma nota de rodapé ao exílio de Trótski. Só aqueles que aceitam estas premissas sobre a importância de Trótski e a ausência de socialismo na União Soviética podem ficar satisfeitos com a explicação trotskista da história soviética.

Todavia há outras visões sobre Stálin e o seu papel no colapso da União Soviética. Uma dessas visões sustenta que o colapso da URSS resultou das "deformações stalinistas", uma espécie de efeito retardado das políticas de Stálin. Esta tese reconhece que a União Soviética construiu o socialismo, baseado na propriedade pública e na planificação, que funcionou bem proporcionando crescimento econômico, defesa militar, emprego, segurança econômica, cuidados de saúde, educação e um nível cultural elevado para os trabalhadores. Não obstante, a luta contra o seu próprio atraso e contra as ameaças internas e externas, bem como outros desafios, conduziram a deformações antidemocráticas. Estas deformações manifestaram-se no «culto da personalidade, na sujeição autoritária de toda a atividade social à disciplina e controle do PCUS, e na subordinação de todo o pensamento e práticas científicas e culturais à ideologia política".

De acordo com esta visão, a economia planificada não constituiu um problema. O problema residia antes no legado do autoritarismo stalinista. O autoritarismo de Stálin teria minado as tentativas de descentralizar o controle e a responsabilidade, coartado a iniciativa e impedido a realização do potencial da economia socialista. Qualquer pessoa minimamente familiarizada com a historiografia ocidental dificilmente estranhará que alguns autores culpem Stálin pelo colapso da União Soviética, uma vez que toda uma série de outros lhe atribuem a responsabilidade por praticamente todas as calamidades do século XX.

Uma figura tão complexa como Stálin, líder de um vasto país que atravessou numerosas crises durante um prolongado espaço de tempo, estava destinada a deixar um legado complicado. Assim, pode-se facilmente admitir a existência dos problemas referidos por aqueles que sustentam a teoria das deformações de Stálin. Por exemplo, na economia planificada, onde a natureza e a dimensão da produção são definidas a partir de cima, existe o problema endêmico da asfixia da iniciativa e da responsabilidade em baixo. A União Soviética debateu-se com este problema durante anos, e Cuba debate-se hoje com ele. Este problema não resulta apenas de Stálin. Por seu turno, sem lhe chamarmos "deformações stalinistas", reconhecemos que a dimensão e os métodos da repressão "deixaram inquestionavelmente uma herança de ressentimento, timidez, servilismo, remorso, e sabe-se lá que mais".

No entanto a história não acaba aqui. Ao avaliar-se o legado de Stálin deve-se distinguir as apreciações morais e políticas – ou seja, se determinadas atitudes e políticas foram boas ou más, justificadas ou injustificadas, positivas ou negativas – das apreciações históricas sobre os seus efeitos e consequências. Ambas são legítimas, mas a questão que temos perante nós é matéria de apreciação histórica. Ou seja: podem efetivamente as políticas de Stálin ser relacionadas com o colapso da URSS? Honestamente, aqueles que defendem a tese das deformações de Stálin pouco fizeram para levar a discussão do campo moral para o da explicação histórica. Stálin deixou uma herança contraditória no que respeita ao autoritarismo e democracia. Aqueles que subscrevem a tese das deformações de Stálin apenas vêem um lado, afirmando que Stálin minou a democracia socialista, desmoralizou e desmobilizou o povo soviético, e que isso, em última instância, socavou a eficiência e a produtividade do sistema socialista, conduzindo-o, a partir daí, ao colapso. Mas onde está a prova desta desmoralização e desmobilização? As grandiosas realizações do povo soviético, entre os anos 30 e os anos 50, a coletivização da agricultura, a rápida industrialização, o aumento do nível educacional e cultural do povo, a derrota da invasão de Hitler, a reconstrução do país em quatro anos, depois da devastação da guerra, dificilmente traduzem o trabalho de uma população desmoralizada e desmobilizada. Bem pelo contrário. Estas realizações exigem uma participação popular ativa. Aliás, um olhar sóbrio sobre o legado de Stálin tem de reconhecer que existem nele elementos de democracia e de participação popular, bem como de autocracia e repressão. A Constituição Soviética de 1936 simboliza esta herança ambígua.

Por um lado, apesar das promessas democráticas da Constituição, a União Soviética permaneceu um Estado em que o poder se concentrava no partido comunista e, de uma forma crescente, no seu líder, onde as nomeações para cargos oficiais e outras se faziam a partir de cima, e onde outras instituições, incluindo os sovietes e os sindicatos, tinham, no melhor dos casos, uma função consultiva. Por outro lado, a Constituição representou uma tentativa, pela primeira vez na história, sob condições favoráveis, de dar um significado à ideia da democracia socialista. A Constituição foi o resultado de dois anos discussão, em que largos segmentos dos trabalhadores, camponeses e outras camadas foram envolvidos num amplo debate nacional do projeto de documento, que foi seguido de um referendo nacional.

A Constituição alargou os direitos democráticos dos cidadãos soviéticos, levantando as restrições eleitorais aos indivíduos associados ao regime tsarista e, ao mesmo tempo que consagrou o papel exclusivo do partido comunista, também introduziu as candidaturas múltiplas, o sufrágio secreto e as eleições diretas. Partindo das constituições burguesas com uma perspectiva revolucionária, a Constituição soviética instituiu direitos econômicos, onde se incluíram: o direito ao emprego, férias pagas anuais, assistência médica gratuita, ensino gratuito até ao sétimo ano inclusive, assistência estatal às mulheres com muitos filhos e mães solteiras, licença de maternidade totalmente paga e acesso às maternidades, enfermarias e jardins-de-infância.[1]

A Constituição de 1936 refletiu ainda um outro legado democrático, designadamente a política soviética para as minorias nacionais. O historiador Terry Martin caracterizou a União Soviética como "o primeiro império do mundo com ação afirmativa". O que Martin quis dizer com isto foi que a União Soviética «criou não só dezena e meia de grandes repúblicas nacionais, mas também dezenas de milhares de territórios nacionais espalhados por toda a vastidão do país. Novas elites nacionais foram instruídas e promovidas para cargos de liderança no governo, escolas e empresas industriais desses novos territórios. Em cada território, a língua nacional adquiriu estatuto de língua oficial do governo. Em dezenas de casos isso implicou a criação de uma língua escrita, que não existia. O Estado soviético financiou a produção em massa de livros, revistas, jornais, filmes, óperas, museus, música tradicional e outras produções culturais em línguas não russas. Nada de comparável tinha sido tentado anteriormente (...) e nenhum Estado multiétnico igualou ulteriormente a escala da Ação Afirmativa Soviética."[2] Segundo um estudo de opinião, realizado em 1950-51 pelo Harvard Interview Project, que abrangeu centenas de cidadãos soviéticos, "a maioria esmagadora" dos inquiridos sobre a Constituição de 1936 concordou que as garantias estabelecidas sobre a igualdade das nacionalidades correspondiam de fato à realidade.[3]

A ambiguidade do legado autocrático e democrático de Stálin até se manifesta nas repressões dos anos 30. A campanha contra os trotskistas e sabotadores em 1937, que conduziu milhões à prisão e milhares à morte, correspondeu a um movimento de massas lançado nos sindicatos e nos locais de trabalho pelo alargamento da democracia. O líder dos sindicatos, Nikolai M. Chvérnik, lançou este movimento no sentido de aplicar nos sindicatos os direitos consagrados na Constituição de 1936, ou seja, eleições secretas com múltiplos candidatos, um maior envolvimento das bases e uma maior prestação de contas por parte das direções sindicais. Este movimento estava de mãos dadas com a campanha contra o culto dos líderes, pela erradicação dos dirigentes corruptos, dos oposicionistas dissimulados e outros "inimigos do povo", que desviavam fundos dos sindicatos, violavam as normas de segurança, sabotavam habitações, serviços sociais e a produção. Como resultado deste levantamento a partir de baixo, no final de 1937, "mais de um milhão e 230 mil pessoas foram eleitas em 146 sindicatos e em centenas de milhares de organizações sindicais e comités de empresa (...) O resultado final das eleições traduziu-se numa mudança radical de quadros. Mais de 70 por cento dos antigos comités de fábrica, 66 por cento dos 94 mil presidentes de comités de fábrica e 92 por cento dos 30.723 membros dos comitês plenários regionais foram substituídos".[4] O que aconteceu nos sindicatos e locais de trabalho em 1937 foi literalmente um movimento democrático a partir de baixo para afastar e punir determinados líderes sindicais. O historiador Wendy Goldman chamou-lhe uma "repressão democrática", e notou que esta "repressão não constituiu um ato contra o povo soviético realizado por uma 'entidade' maléfica, mas foi ativamente apoiada e difundida pelo próprio povo em todas as instituições".[5]

Em suma, se olharmos objetivamente para o legado de Stálin, não vemos ligações diretas entre Stálin, o autoritarismo, a desmobilização popular e o colapso da URSS. Tanto no enunciado da Constituição de 1936 como na política das nacionalidades e no movimento de democratização dos sindicatos de 1937, pelo menos, ao contrário de desmobilizar, Stálin mobilizou as massas. Aliás, se as políticas de Stálin tivessem tido o efeito de desmobilizar e desmoralizar o povo soviético, dificilmente a sua morte seria motivo de tão grande consternação, nem se esperaria que passados 50 anos a sua personalidade continuasse a ser venerada. No entanto, é precisamente isso que as sondagens mostram.[6]
Em suma, pode admitir-se com facilidade que o legado democrático de Stálin é ambíguo. No entanto, só uma visão muito unilateral e distorcida de Stálin poderá concluir que as "deformações" de Stálin desmobilizaram politicamente as massas trabalhadoras a tal ponto que foram a causa principal do colapso da URSS.


Uma terceira reação


             A terceira reação ao nosso livro não é propriamente uma crítica, mas antes uma pergunta, colocada nos seguintes termos: por que razão o partido comunista e a classe operária soviética não se opuseram às políticas de Gorbatchov, sublevando-se em defesa do socialismo? No livro abordamos esta questão (pp. 267-273). É certo que o fato de a resistência das bases não ter sido grande, nem maior o seu êxito, constitui o aspecto mais perturbador em todo o processo da dissolução da União Soviética. Mas por muito perturbador que seja, este fato em si e por si não permite saltar para a conclusão de que havia alguma coisa errada no socialismo soviético ou que o socialismo soviético frustrou as expectativas dos trabalhadores de uma forma fundamental.

Gorbatchov pretendia que se podia resolver os problemas do socialismo fazendo concessões aos imperialistas e incorporando ideias do capitalismo no socialismo. Parte disto passava pela introdução de aspectos da democracia burguesa, ao mesmo tempo que as instituições tradicionais da democracia socialista eram minadas e marginalizadas. Para se compreender a ineficácia da resistência da classe operária não precisamos de ir muito além disto. Os comunistas e trabalhadores soviéticos viram-se privados das vias tradicionais de expressão, ao mesmo tempo que o seu líder formal introduzia gradualmente ideias capitalistas, embrulhadas na noção de aperfeiçoamento do socialismo. Na nossa opinião, as coisas não tinham de se passar desta forma. Reformas diferentes e um processo diferente de reformas, que mobilizassem o partido comunista e a classe operária, poderiam produzir resultados diferentes. Isto havia sido tentado por Iúri Andrópov, mas o esforço foi de curta duração, devido à sua doença e morte.

Duas recentes visitas a Cuba e um estudo sobre as presentes reformas em curso, chamadas «atualização», reforçaram a nossa conclusão sobre o destino do socialismo soviético. Obviamente que a União Soviética e Cuba são dois países completamente diferentes, com histórias e situações muito diferentes. Uma diferença significativa foi o embargo econômico e comercial imposto pelos EUA a Cuba. Apesar de a União Soviética também ter passado por um bloqueio econômico durante duas décadas, o embargo a Cuba dura há mais tempo e o seu custo é relativamente mais elevado. Hoje, passados 50 anos, segundo estimativas moderadas, o embargo custou aos cubanos mais de 104 bilhões de dólares a preços correntes, e se considerarmos a desvalorização do dólar em relação ao ouro, esse valor sobe para 975 bilhões de dólares.[7] Sem o boicote, hoje, o nível de vida em Cuba poderia ser semelhante ao da Europa Ocidental.[8]

Não obstante as diferenças óbvias, Cuba e a União Soviética têm algumas características comuns. Ambas as economias se baseiam na propriedade pública e na planificação centralizada, dirigidas pelo partido comunista, e tanto a sociedade soviética em 1985 como a cubana em 2011 enfrentavam problemas similares, embora em graus diferentes. Por exemplo, ambas tinham duas moedas, uma convertível em divisas internacionais e outra interna. A divisa soviética, interdita à maioria dos cidadãos, estava limitada aos turistas, diplomatas e alguns outros representantes, e era usada apenas nas lojas em divisas. Em Cuba, no entanto, a moeda convertível não é ilegal, e muitos cubanos auferem legalmente rendimentos em pesos convertíveis, por trabalharem na indústria do turismo, sob a forma de prêmios em certas outras entidades, ou ainda provenientes de remessas de familiares emigrantes.

A existência de duas moedas gera mais problemas em Cuba do que no caso da União Soviética. A grande disparidade entre o valor do peso (CUP) e do peso convertível (CUC), na ordem de 25 para 1, criou uma série de problemas, incluindo uma crescente desigualdade entre aqueles que têm acesso à moeda convertível e os que não têm, e uma fuga de cérebros de profissões sem salários em divisas para aquelas que permitem esse acesso, como é o caso do turismo. Conduzir um táxi pode proporcionar gorjetas em divisas de valor superior aos rendimentos de um professor. Isto é claramente desmoralizador e ineficiente. Um outro exemplo de um fenômeno presente nas duas sociedades é a segunda economia, ou mercado negro. Na União Soviética a segunda economia constituía um problema maior do que em Cuba. Na União Soviética a segunda economia existiu durante um período mais longo, estava mais espalhada e desenvolvida, e ligada com frequência a minorias nacionais e à "máfia" organizada.[9]

Em certos aspectos, os problemas de Cuba e da União Soviética [nos anos 80] são semelhantes: deficiências na produtividade e eficiência, qualidade insuficiente dos bens de consumo, falta de iniciativa e de sentido de propriedade e responsabilidade no local de trabalho, difusão insuficiente das tecnologias computacionais, etc. Além disso pode-se encontrar facilmente semelhanças entre as soluções propostas por Iúri Andrópov, em 1983 (e mesmo entre as políticas iniciais de Gorbatchov), e o programa cubano de reformas de "atualização", proposto em 2011. Por exemplo, nos dois casos as reformas visavam aumentar a eficiência, a produtividade, a motivação e a qualidade através da recompensa do esforço, da descentralização do controle e da responsabilidade, do desenvolvimento de empresas mistas com capitais estrangeiros, de incentivos às cooperativas e da concessão de maior latitude à iniciativa privada.

Mas os processos na União Soviética e em Cuba diferem de forma flagrante. Em Cuba o processo de reformas envolveu os comunistas de base e os trabalhadores de uma forma muito mais ampla do que na União Soviética. Em Cuba, entre o desenvolvimento das orientações da reforma em 2010 até à sua implementação em 2014, houve todo um processo que implicou o envolvimento das massas e a construção de um consenso de massas.

O processo começou entre dezembro de 2010 e fevereiro de 2011, com debates com o povo em geral, seguiram-se debates no partido em todas as províncias, e por fim debates no VI Congresso do Partido Comunista de Cuba (PCC) em abril. No total realizaram-se 163.079 reuniões, em que estiveram 8.913.828 participantes. Destes debates resultou um importante conjunto de alterações: "O documento original continha 291 linhas de orientação, das quais 16 foram incorporadas noutras, 94 mantiveram a sua redação, o conteúdo de 181 delas foi modificado e foram incorporadas 36 novas linhas de orientação, para um total de 311 no atual projeto. (...) Aproximadamente mais de dois terços das linhas de orientação, exatamente 68 por cento, foram reformulados." [10] O debate das linhas de orientação decorreu ainda através de cartas publicadas no jornal Granma, em programas de rádio, em blogs na Internet e nos sindicatos.[11] Um observador anotou: "O elemento-chave aqui é que o projeto da nova lei laboral implica um processo de consulta com a Central dos Trabalhadores de Cuba (CTC) tão detalhado e extensivo que os sindicatos têm de fato o poder de veto".[12]

Na União Soviética, Iúri Andrópov iniciou as reformas econômicas com debates nos locais de trabalho. Todavia, para Gorbatchov, os debates com as bases sobre as mudanças foram sobretudo uma oportunidade para promover a sua imagem pública. Os amplos debates, o estímulo à crítica e a construção de consensos estiveram praticamente ausentes no processo de reformas de Gorbatchov. Se tivesse sido de outro modo, será que hoje nos interrogaríamos sobre onde estavam os comunistas soviéticos e os trabalhadores?

Mas se os dois tipos de críticas ("o atraso soviético" e "as deformações de Stálin") não são convincentes, por que razão continuam a ser tão populares? Na nossa opinião a razão da popularidade destas explicações é que elas decorrem e dependem da omnipresente ideologia do anti-stalinismo e do anticomunismo. O anticomunismo e o anti-stalinismo não são meras discordâncias com o sistema socialista ou com as políticas de Stálin, antes consistem na apresentação deste sistema e deste homem como o pior mal do mundo. Para a maioria dos intelectuais ocidentais o dogma de que "Stálin é um monstro" não é susceptível de discussão. É um axioma. Pior, é um tabu. É a chave-mestra que dá acesso à família de autores admitidos pela ideologia dominante. Os acadêmicos dos EUA, mesmo aqueles com pontos de vista não ortodoxos, inscrevem rotineiramente referências hostis a Stálin nos seus trabalhos, mesmo quando não incidem sobre a história da União Soviética, para assim garantirem a sua aceitação política.

A razão de o anti-stalinismo continuar a ser a pedra-de-toque merece mais atenção do que tem tido. Recentemente, acadêmicos como Domenico Losurdo e Grover Furr[13] lançaram luz sobre esta questão. A circunstância de a demonização de Stálin ter o apoio de toda a esquerda, graças a Trótski e a Khruchov, é seguramente um dos fatores. Uma outra razão é o facto de Stálin ser o símbolo personificado da URSS entre 1924 e 1953, o período do êxito da construção do socialismo, e também o período em que o Estado soviético era o maior inimigo do imperialismo. Seja qual for a razão, para os marxistas, como são alguns dos nossos críticos, condescender com estereótipos anti-Stálin e polemizar na sua base, deve ser entendido como uma concessão oportunista à pressão da ideologia da classe dominante. Evidentemente que a rejeição do anti-stalinismo não equivale à beatificação de Stálin, a um amontoado de elogios à sua pessoa, ou ainda menos ao escamoteamento dos problemas associados à sua liderança. Significará antes, um trabalho acadêmico paciente, que use os mesmos critérios que são requeridos para avaliar qualquer líder do século XX.

Conclusão


            As principais críticas levantadas contra os argumentos do Socialismo Traído não resistem a um escrutínio rigoroso. A ideia de que a União Soviética estava condenada por um defeito congênito, a saber, o atraso das forças produtivas, agrada sobretudo àqueles que sonham com um avanço gradual para o socialismo, e àqueles que pensam que os chineses descobriram a estrada de ouro para o futuro. No entanto, tal ideia implica que se ignore os problemas gerados pela NEP nos anos 20 e na China hoje, e significa subestimar as difíceis opções que os soviéticos tiveram de fazer nos anos 20 e 30, bem como os tremendos progressos que fizeram para superar o atraso.

A ideia de que o colapso da URSS em 1991 se deveu ao autoritarismo de Stálin nos anos 30 assenta numa montanha de preconceitos contra Stálin e numa leitura unilateral do seu legado que ignora os seus marcados elementos democráticos. Finalmente, a ineficácia da resistência dos comunistas de base e dos operários à destruição do socialismo não prova a existência de problemas profundamente enraizados do socialismo soviético. Mostra no entanto que a destruição da propriedade socialista, da planificação, dos benefícios sociais e do internacionalismo exigiram a erosão simultânea da autoridade do partido comunista e das instituições da democracia socialista. Se alguma coisa boa adveio do colapso da URSS foi o fato de Cuba parecer ter aprendido a lição.



Notas

[1] Leonard Schapiro, The Communist Party of the Soviet Union (New York: Vintage Books, 1971), 409; Kenneth Neill Cameron, Stalin: Man of Contradiction (Toronto, NC Press Limited, 1987), 80-81.

[2] Terry Martin, The Affirmative Action Empire: Nations and Nationalism in the Soviet Union, 1923-1939 (Ithaca and London: Cornell University Press, 2001), 1-2.

[3] Martin, 387-389.

[4] Goldman, 14.

[5] Goldman, 19.

[6] Richard Pipes, “Flight from Freedom: What Russians Think and Want,” Foreign Affairs (May/June, 2004), 14.

[7] Cuba vs Bloqueo: Relatório de Cuba sobre a Resolution 65/6 da Assembleia Geral das Nações Unidas intitulado “Necesidad de poner fin al bloqueo económico, comercial y financiero impuestopor los Estados Unidos de América contra Cuba” (July 2011), 54.

[8] Interview of Manual Yepe, Havana, Cuba, February 18, 2014.

[9] Interview of Marta Nunez, Havana, Cuba, February 18, 2014.

[10] “Information on the results of the debate on the Economic and Social Policy Guidelines for the Party and the Revolution”, traduzido por Marce Cameron, 2.

[11] Steve Ludlam, “Cuba’s Socialist Development Strategy,” Science & Society 76, no. 1 (January 2012), 47.

[12] Ludlam, 51.

[13] Domenico Losurdo, Staline: Histoire et Critique D’Une Légende Noire and Grover Furr, Khrushchev Lied (Kettering, Ohio: Erythros Press and Media, 2011).

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